terça-feira, 2 de setembro de 2008

As conseqüências da deliberação negativa: comentário acerca do documentário “O longo caminho para casa”




O homem se define como ser individual ao mesmo tempo que social e para que sejam balanceados estes dois lados de sua natureza, o mesmo estabelece normas e regras para que a interação do seu eu com o outro se fundamente a partir dos princípios de liberdade e respeito à categoria de ser humano.
No instante em que o homem se estabelece como ser deliberador de decisões a partir de uma reflexão anterior à ação e fundamenta seus julgamentos, podemos por assim dizer, que o processo de formação de determinada conduta estaria estabelecido. Afirmamos assim, que sentimentos como tolerância, e digamos que, o seu oposto negativo, a intolerância, seriam frutos deste processo de: deliberar, decidir e agir.
Falemos, então, do pólo de maior inclinação do ser humano, a intolerância. Tal sentimento, ou podemos dizer, vício, caracteriza-se como uma espécie de egocentrismo do pensamento, ou melhor, como a tentativa de designação de uma verdade absoluta, ao mesmo tempo, que superior às idéias de outros homens. Verdade esta que não se importará em descartar os princípios e normas básicas estabelecidas por este ser único e racional em relação ao seu igual: a liberdade, o respeito, a preservação da vida.
A intolerância ao longo de nossa história tornou-se um vetor para muitas das ações humanas, expressando-se na vida social em determinados níveis. A intolerância demonstrada quando ignoramos uma pessoa no dia-a dia pelo fato de suas diferenciadas características: classe social, opção sexual, religião, sem dúvida, parte dos mesmos princípios da intolerância que levaram os nazistas à quase dizimar os judeus, ou as que levam estes mesmos judeus a constantes confrontos com os árabes na palestina. Porém, há algumas diferenças quanto à tentativa de explicações e o grau das conseqüências de tais atos, os nazistas atribuíam os males que assolavam seu povo à existência de seres inferiores, sem pátria, que se tornariam ameaças à prosperidade da raça ariana. Enquanto que as questões dos conflitos na entre os palestinos e israelenses, se justificariam, de um lado para os judeus como a luta pelo direito ao refúgio a tantas perseguições sofridas por seu povo, além de tal território ter sido prometido aos mesmos pelo próprio Deus. Já para os árabes, a motivação para tais confrontos seria justificada também por motivos religiosos, este território teria para os mulçumanos importância sagrada, pois, segundo a crença, seria o lugar onde o profeta Maomé teria sido elevado aos céus, além de acreditarem nos direitos genuínos sobre tal território em função de terem vivido neste local por muitos anos. Constatamos assim, que por trás da repulsa radical intolerante há sempre conceitos pré-estabelecidos provenientes de ideologia religiosa, cultural ou econômica.
No filme: “Um longo caminho para casa” retrata justamente a intolerância em nível elevado e avassalador, o motor para um dos momentos históricos mais vergonhosos vivenciados pela humanidade, o genocídio dos judeus pelos nazistas.
Na realidade o filme se posiciona de maneira diferenciada da maioria dos relatos do cinema que abordam tal assunto, pois demonstra realmente o caminho percorrido pelos judeus após o fim da Segunda Guerra Mundial até a criação do estado de Israel e a assimilação do mundo quanto à tragédia que quase dizimou este povo.
Deixemos claro também que não somente os judeus foram perseguidos pela feroz intolerância de Adolf Hitler, destaquemos também a perseguição ocorrida contra os homossexuais, os testemunhas de Jeová, os ciganos, os doentes mentais, ou seja, todas as pessoas consideradas inferiores à categoria de raça ariana perfeita, proposta pelo mesmo.
Através das idéias de Adolf Hitler, este mentor da estruturalização de um sistema de poder que propunha o surgimento de uma raça perfeita, fundamentada na pureza genética, unificada em uma só cultura, no caso, a alemã, sem seres inferiores, ou seja, sem indivíduos diferentes à suas características gerais. Tal homem em sua magnitude estrategista aproveitou-se das fraquezas de uma sociedade alemã desestruturada e nada próspera, após a I Guerra Mundial, para materialização de suas idéias preconceituosas e intolerantes. Primeiramente, a partir da dominação dos meios de comunicação em massa, disseminando a idéia que todos os males da sociedade alemã e do mundo provinham, segundo ele, principalmente dos judeus, que de certa forma, já carregavam uma herança religiosa envolta em instabilidades históricas com carga cultural bastante tradicional. Além, é claro, do posicionamento econômico ocupado pelos mesmos, que em meio em tantas instabilidades sociais na Europa, conseguiam manter-se economicamente estáveis.
Hitler, sem dúvidas, aplica sua estratégia baseada na suposta purificação da Alemanha e quase consegue alcançar plenamente seu objetivo maior, o extermínio dos judeus. A través de meios covardes e desumanos para tal, como: câmaras de gás, torturas das mais atrozes, fuzilamentos em massa, utilização de seres humanos como cobaias em projetos científicos e muitos outros, o que segundo estatística acarretaram mais ou menos 6 milhões de vítimas somente judeus e mais ou menos 30 milhões pessoas, consideradas por Hitler empecilho para o alcance de seu suposto jubilo.
As idéias nazistas, sem dúvida, ultrapassaram os limites da intolerância, pois, os seres humanos além de assassinados, foram subjugados a condições ínfimas de sobrevivência. O documentário nos demonstra que tais condições e tais tratamentos subumanos nunca haviam sido pensados, pois o terror e o asco que os soldados das tropas aliadas sentiram, ao se deparar com os sobreviventes em estado de subnutrição foram inevitáveis. Para os prisioneiros o momento da libertação, representou o instante em que os mesmos conseguiram perceber a que níveis degradantes haviam sido submetidos, o que ocasionariam conseqüentemente sentimentos de vergonha , de certa forma, de admissão de sua inferioridade.
O documentário relata que a suposta libertação dos sobreviventes se tornaria, tão somente, o início da luta dos judeus por melhores condições de vida e a retomada da auto-estima desse povo. Povo que mesmo após sua libertação continuou sofrendo com a intolerância, porém, agora envolto em sentimento de indiferença. Segundo o documentário, o mundo relutou em reconhecer as condições as quais teria sido submetido do povo judeu e as atrocidades praticadas pelos nazistas, indiferença esta, que poderia ser percebida devido aos tratamentos semelhantes dispensados aos judeus no campo de refugiados dirigidos pelas forças aliadas, pórem, agora com um discurso ideológico diferenciado, partindo das idéias de suposta esperança e libertação. É bastante clara a posição que os judeus ocuparam neste momento histórico, nada mais eram que uma espécie, de fardo do mundo, já que qual país aceitaria um povo miserável e que o mundo houvera rejeitado sua condição de ser humano? Qual país estaria disposto a ajudar um povo estigmatizado por suas raízes e carga histórica, proporcionado-lhes a possibilidade de futuro?
Os refugiados judeus por iniciativa própria e solitária a todo custo passaram a lutar por sua liberdade, pois como cita um dos refugiados do documentário: “os nazistas nos mataram e os aliados não nos deixam viver”. E é por esta liberdade que os judeus, a partir daquele instante fundamentaram sua esperança. É bastante evidente a perseverança de um povo que mesmo em completa degradação e que obtivera todos os seus direitos cessados, tornar real a luta inconstante por preservação de seu povo e cultura. Assim, os judeus levantaram a bandeira da verdadeira libertação, ou seja, a retomada da dignidade humana a partir da luta por um território que anos a fio, após o fim da guerra, foi almejado pelos mesmos. Assim, o mundo com intuito de “resolver” a causa judaica cria o estado de Israel em 1948, o que conseqüentemente acarretaria ao povo judeu uma nova luta,  está com novas justificativas e novas e negativas conseqüências, porém embasadas nos mesmos princípios intolerantes.
Assim, a intolerância contra o povo judeu, materializado junto aos horrores da II Guerra Mundial, levaram o homem à nova reflexão e analise sobre os princípios que regem e caracterizam a dignidade humana, assim foram criados acordos para estabelecer novas diretrizes de apóio e respeito à vida, para que o homem não seja desrespeitado e nem julgado por sua raça ou credo, para que a humanidade não cometa os mesmos erros ou que possamos, pelo menos, proceder de melhor maneira, caso tais acontecimentos venham a ocorrer e acima de tudo para que consigamos desvencilhar as gerações futuras de tais acontecimentos vergonhosos, preconceituosos e degradantes.

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